domingo, 15 de junho de 2014

Vinícius de Moraes explica a Bossa Nova

"O que é bossa nova?
Bossa nova é mais Greenwich Village do que 52nd Street, é mais uma chuva fina olhada através da janela de um modesto hotel da 46th Street do que um rubro poente sobre a ilha de Manhattan, visto do Empire State Building. Bossa nova – para citar esse grande new yorker que foi o poeta Jayme Ovalle –, é mais a namorada que abre a luz do quarto para dizer que está, mas não vem, que a loura bonita num casaco de mink que se leva para dançar no El Moroco.
Bossa nova é mais a estrela da tarde quando brilha sozinha no crepúsculo, entre dois arranha-céus, que todo um céu constelado entrevisto de um alto terraço em Hyde Park. Bossa nova é mais uma moça triste atravessando a Broadway quando já se apagam suas luzes que o Great Highway tumultuado em que todas as raças se cruzam e todas as impiedades são permitidas.
Bossa nova é mais a solidão de uma rua de Ipanema que a agitação comercial de Copacabana. Bossa nova é mais um olhar que um beijo; mais uma ternura que uma paixão; mais um recado que uma mensagem. Bossa nova é o canto puro e solitário de João Gilberto eternamente trancado em seu apartamento, buscando uma harmonia cada vez mais extremada e simples nas cordas do seu violão e uma emissão cada vez mais perfeita para os sons e palavras de sua canção. Bossa nova é também o sofrimento de muitos jovens, do mundo inteiro, buscando na tranqüilidade da música não a fuga e alienação aos problemas do seu tempo, mas a maneira mais harmoniosa de configurá-los. Bossa nova é a nova inteligência, o novo ritmo, a nova sensibilidade, o novo segredo da mocidade do Brasil: mocidade traída por seus mais velhos, pais e educadores, que lhe quiseram impor os próprios padrões, gastos e inaceitáveis. Bossa nova foi a resposta simples e indevassável desses jovens a seus pais e mestres: uma estrutura simples de sons super-requintados de palavras em que ninguém acreditava mais, a dizerem que o amor dói mas existe; que é melhor crer do que ser cético; que por pior que sejam as noites, há sempre uma madrugada depois delas e que a esperança é um bem gratuito: há apenas que não se acovardar para poder merecê-lo."



Vinícius de Moraes, janeiro de 1965 
(fonte http://tremartesanal.blogspot.com.br)

terça-feira, 13 de maio de 2014

“Brilhar para sempre,
brilhar como um farol,
brilhar com brilho eterno,
gente é para brilhar,
que tudo mais vá para o inferno,
este é o meu slogan
e o do sol.” 

         Vladimir Maiakóvski

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

“Água, água, água...”

Este texto faz referência ao artigo “Água, água, água...”, do historiador José Sebastião Witter, publicado no jornal O DIÁRIO (Mogi das Cruzes/SP), em 19/02/2014, reproduzido ao final. 
Os dois tratam desse assunto candente que nos assombra, o da produção insuficiente da água, seu desperdício na distribuição, a inércia do Estado, a insensibilidade e falta de consciência dos usuários e o fantasma do racionamento.


                                                                       (foto http://www.edhorizonte.com.br/tiete/imagens-2/3-3/)

Novamente o senhor merece parabéns pelo tema escolhido. Falar sobre a água é fundamental. 
Eu sou membro titular do Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, que congrega 36 municípios, inclusive os da nossa região. Nessa crise da Cantareira, poucos souberam que foi o SPAT - Sistema Produtor Alto Tietê quem sustentou a demanda da RMSP – Região Metropolitana de São Paulo. Acho até que os governantes sabiam, mas tambem acho que não lhes convinha demonstrar ou expor, e nem também valorizar com as compensações ambientais devidas. Para quê dar satisfações? 
Mas tem um lado interessante nesta estória: a SABESP tem um índice de perda (desperdicio) de 25%, inclusive na Cantareira. Ora, mesmo considerando que é "educacional" incentivar a economia e evitar o desperdicio para a preservação da quantidade e qualidade produzida, o "gasto exageradamente desnecessário da população" não chegará nem perto do volume de "perda" da SABESP. E veja o senhor que em Mogi o índice do SEMAE – Serviço Municipal de Águas e Esgoto é de 60%, uma loucura! 
Então, caro Sebastião, eu tambem acho, como muitos, que o exemplo "deveria" começar do governo. Senão vejamos: hoje são necessários 85m³/s (metros cúbicos por segundo, e em números redondos) para abastecer aproximadamente 20 milhões de pessoas na RMSP; quer dizer, 21,25m³/s são desperdiçados. E aqui no SEMAE, que tem outorga para captar no Tietê 2,00m³/s (aproximadamente, e em números redondos), 1,2m³/s não  é aproveitado. 
Isso não é um absurdo? Isso não é um descabimento? Uma vergonha? Uma falta de gestão? Sabe qual é o volume produzido pela ETA-Taiaçupeba? É de, no máximo, 15m³/s, e abastece aproximadamente cinco milhões de paulistanos. Quantos paulistanos seriam abastecidos com 21,25m³/s? A conta é facil de fazer. Será que a população desperdiça esse volume? Duvido. O descontrole é tanto que o SEMAE até ousa justificar e convencer que se deva reativar a ECR-I, captando em um trecho do rio Tietê sabidamente de Classe III, locais terminantemente proibidos por Lei Estadual Específica. 
Está lá escrito na Lei Estadual 9.866/97, no parágrafo 3º do Artigo 25, com todas as letras e claramente: "Não serão permitidas captações em trechos classificados como Classe III". 

Mas, como somos todos uns "bananas", vamos fazer "vistas grossas" e continuar criando um enorme "problema insolúvel" para os nossos netos e descendentes, inviabilizando o consumo humano, evidentemente. É preciso que saibamos distinguir "crescimento" de "desenvolvimento". Explore o tema, senhor Sebastião. São poucos os que o fazem. Abraços.
(José Arraes é membro Comitê da Bacia do Alto Tietê, do Subcomitê da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê e do conselho gestor da Área de Proteção Ambiental (APA) da várzea do Tietê)

“Água, água, água...”

Diversas vezes escrevi sobre água e desperdício e, em mais de uma vez, usei o mesmo título... A primeira vez foi lá pelos anos noventa, do século XX e mais recentemente em 2007 e 2013. Volto ao mesmo tema num momento em que quase todos os meios de comunicação estão a alertar a população para o fenômeno da seca, que nos afeta e afetará a todos. Então, temos os registros históricos de situações iguais ou semelhantes e as comparações inevitáveis entre o calor do hemisfério sul, com os incêndios da Austrália, realmente assustadores e as nevascas dos Estados Unidos e, agora na China e Japão.
Mas, fiquemos com a situação do sistema Cantareira que abastece São Paulo (capital) e com as questões mais próximas de nós mogianos.
Tanto o Sistema Cantareira como as represas mogianas estão com as suas reservas diminuídas desde que as chuvas começaram a rarear, e já no fim do ano passado. E o desabastecimento poderia ter sido previsto desde então, não é verdade?  Por que somente agora as autoridades começam a alertar os cidadãos para que economizem para evitar racionamento, o que já está ocorrendo em diversas cidades... Em outras não há racionamento, mas falta água nas torneiras e com a falta dela, todos os aborrecimentos... . Então, me pergunto, onde estão os institutos que prevêem as questões metereológicas em todo o país e que o fazem com certa precisão... Não foram ouvidos ou não se deram conta do fenômeno? Estou mais para desatenção das autoridades do que para ineficiência dos órgãos responsáveis pelas previsões do tempo. Em tantos laboratórios que cuidam da questão há inúmeros cientistas competentes, que não devem ter deixado de falar da questão... E com a antecedência necessária e não com as informações de todos os jornais de Rádio e Tv, que falam da questão todos os dias.
Conscientizar cidades inteiras, ou pelo menos bairros populosos não é fácil e é próprio do ser humano, quase sempre, transgredir ou desobedecer. Nós todos só diminuímos o tempo do banho ou fechamos a torneira enquanto escovamos o dente quando sentimos na pele que, em dias anteriores, a água não chegou...
Creio que está na hora de as autoridades e todos os cidadãos começarem a pensar no futuro não tão longínquo em que a água não chegará e a desertificação começará a acontecer...
É hora, também, de uma grande campanha publicitária ininterrupta a alertar todos e cada um que preservar a água é um ato de preservação da espécie... Será que alguém vai ler? E até...

 (José Sebastião Witter é historiador)

http://odiariodemogi.com.br/opiniao/artigos/21715-agua-agua-agua.html


sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O melhor de Fernando Pessoa é ele mesmo ou um outro.


                       Impressões do Crespúsculo

                                         Paúis

Paúis de roçarem ânsias pela minh' alma em ouro...
Dobre longínquo de Outros Sinos... Empalidece o louro
Trigo na cinza do poente... Corre um frio carnal por minh' alma...
Tão sempre a mesma, a Hora!... Balouçar de cimos de palma!
Silêncio que as folhas fitam em nós... Outono delgado
Oh que mudo grito de ânsia põe garras na Hora!
Que pasmo de mim anseia por outra coisa que o que chora!
Estendo as mãos para além, mas ao estendê-las já vejo
Que não é aquilo que quero aquilo que desejo...
Címbalos de Imperfeição... Ó tão antiguidade
A Hora expulsa de si-Tempo! Onda de recuo que invade
O meu abandonar-se a mim próprio até desfalecer,
E recordar tanto o Eu presente que me sinto esquecer!...
Fluido de auréola, transparente de Foi, oco de ter-se.
O Mistério sabe-me a eu ser outro... Luar sobre o não conter-se...
A sentinela é hirta - a lança que finca no chão
É mais alta do que ela... Para que é tudo isto.... Dia chão...
Trepadeiras de despropósitos lambendo de Hora os Aléns...
Horizontes fechando os olhos ao espaço em que são elos de ferro...
Fanfarras de ópios de silêncios futuros... Longes trens...
Portões vistos longe... através de árvores... tão de ferro!

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Advertência.

"O Subindo nas Tamancas busca abrigar novos olhares sobre o Alto Tietê Cabeceiras, um exercício de cidadania e de convivência democrática que visa compreender sua realidade a partir da troca de informações e de experiências. 

A participação é livre e as opiniões individuais serão respeitadas. Não serão tolerados ataques pessoais, discriminações ou preconceitos de qualquer espécie."

Origem dos tamancos, socos e socas

Origem dos tamancos, socos e socas

A indústria do calçado na região de Braga, Guimarães e Barcelos é abundante e antiquíssima, pois andou sempre ligada à de curtimenta de peles.
Assim, “existiu em Guimarães uma confraria dos sapateiros, sob a evocação de Santa Maria, cuja constância no tempo vem desde o século XIII e se projectara numa continuidade admirável sob o título abreviado de Irmandade de S. Crispim”, que foi fundada no ano de 1315 pelos sapateiros João Baião e Pedro Baião.
Nesta região, usava-se o calçado de madeira, comummente conhecido por tamancos e socos.
E, se bem que em tempos passados o povo tivesse andado descalço, este calçado impunha-se como meio de protecção na realização de alguns trabalhos agrícolas, tendo por isso os seus melhores defensores na gente da lavoura.
Feito de pau de amieiro e um pouco de couro, este calçado humilde tem também a sua história.
Popularmente, os tamancos têm as designações de socos e taroucos. Se a pessoa que os usava era uma mulher, os tamancos eram designados por tamancas, os socos por socas, e os taroucos passavam a ser taroucas.
A propósito deste assunto, José Leite de Vasconcelos, o mestre da etnologia, refere que “as mulheres usam tamancas ou socas, que são menores e mais apuradas do que os tamancos, mas com sola de madeira”.
De qualquer forma, o tamanco era mais usado pelo homem e o soco mais usual na mulher, sendo inquestionável que este foi o calçado dos pobres, sem esquecer que também os ricos o usaram em muitas emergências do tempo e da fortuna.
Era de igual modo costume os membros da Igreja na diocese bracarense usarem este tipo de calçado.
As próprias condições físicas do terreno foram as inspiradoras do artífice tamanqueiro. Nas terras do litoral, o pau do tamanco é raso. No interior, o tamanco começa a arquear a biqueira. Já nas terras bravas das serras, o tamanco arqueia ainda mais, cingindo o couro mais ao pé, para melhor se acomodar ao terreno e à marcha.
As oficinas dos tamanqueiros situavam-se mais no recôndito das aldeias do que nos povoados urbanos. Lá, o tamanqueiro talha as peles (de couro para os socos de homem e de crute para os socos de mulher), e prega as peles aos paus. Utiliza moldes de cartão grosso para cortar as peles e usa uma fôrma para fixar o cabedal ao pau através de tachas. O pau utilizado era obtido do amieiro. Para consegui-lo, o artífice ia pelas aldeias à procura de amieiros, e esperava pelas quadras de lua para os poder cortar.
O tamanco era fabricado em maiores quantidades no Inverno, começando na Primavera a fabricação da chinela de calcanhar aberto, que era calçado confortável, higiénico e típico.
A chinela era usada tanto pelo lavrador como pelo homem do centro urbano e até mesmo pelo caixeiro antigo, de traje à época e chinela de couro açafroado. Este facto faz-nos compreender que a chinela não só era usada na aldeia, mas também no centro urbano.
A chinela de mulher era talhada para ser usada por gente de pé descalço. A sua forma é calçadeira, quase rasa e de bicos aguçados; o tacão era baixo e em sola, e o cabedal era preto, em verniz ou “vitela da terra”.
A gáspea, no peito do pé, é bordada com retrós de cores. Se a chinela for para uma viúva terá de ser lisa.

Actualmente, ainda encontramos pequenas oficinas onde se continua a fabricar calçado de pau para um reduzido número de clientes que o preferem ao calçado de materiais plásticos, para enfrentar tanto o calor no Verão, como a humidade e o frio do Inverno nos campos.
fonte: http://xuzwalkonme.wordpress.com/origem-dos-socos/

fugindo do mar

O Tietê é um rio do contra: nasce lá no alto da Serra do Mar, quase despinguelando para o Atlântico e, caprichosamente, debanda para dentro do território, atravessa o que hoje é o estado de São Paulo e se esbalda nas águas caudalosas do rio Paraná. Esse é um rio tipicamente paulista, voltado para dentro, a partir do qual o caráter daquela gente rude foi forjado, gente saída da vila de Piratininga para explorar a terra, caçar índios e tentar encontrar ouro (e esmeraldas).

É das cabeceiras desse rio do contra que se volta nosso olhar, a gente da nascente, as planícies e as terras férteis de Biritiba, de onde se abre a grande várzea do velho Anhembi banhando as bordas da Serra do Itapety, os campos do Mirambava, na sinuosa estrada d'água cortando Itaquá a caminho da vila de Anchieta.

Quanta história e quantas estórias: as danças e as músicas do Divino, a resistência da dança de São Gonçalo, a primeira experiência radiofônica de que se tem notícia, as capelas e as igrejas com suas pinturas, o impacto da Estrada de Ferro Central do Brasil, as flores, as frutas, os imigrantes. Quanta história e quantas estórias: esse o objeto de nossos olhares. Venha conosco. Com certeza você tem algo a dizer. Ou alguém da família. Ou os amigos, os vizinhos. Venha compartilhar conosco. Suba nas tamancas e solte o verbo: o espaço, esse espaço todo, é nosso.